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Carf, os dividendos engenhosos e outras questões fiscais

A dedução do ágio adquirido em operação societária gera economia fiscal, porém, por impactar negativamente o lucro, diminui a distribuição de dividendos para os acionistas de uma companhia.

No julgamento abaixo, apreciada forma peculiar de compensar os acionistas por essa consequência negativa do ágio, em caso em que (a) “XX” adquiriu o controle de “YY” com ágio, (b) os acionistas de “XX” permutaram suas ações com ações da autuada “ZZ”, que passou a controlar “XX”, e (c) “YY” incorporou “XX” e passou a amortizar o ágio. E Turma do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf) reconheceu legítima uma política especial de dividendos de “YY”; assim ementado e fundamentado:

Acórdão 1301-001.689 (publicado em 24.11.2014)
OMISSÃO DE RECEITA. DESDOBRAMENTO E RESGATE DE AÇÕES. NATUREZA JURÍDICA. DIVIDENDOS.
A operação “desdobrando e resgate de ações”, tal como realizada nos autos e autorizado em processo de consulta, visando à proteção dos interesses dos acionistas importa igualmente em distribuição de parcela do lucro da companhia, de modo a caracterizar-se dividendo, que é isento de tributação.

Voto (…)
Ficou demonstrado ainda, que o registro dessa amortização [ágio] como despesa consubstanciava um benefício fiscal, uma vez que dedutível na apuração do lucro real e, para compensar o impacto negativo do fluxo de dividendos para os acionistas, causado pela redução do lucro da empresa, a “YY” adotou o mecanismo de “desdobramento e resgate de ações”, com respaldo em decisões da ANEEL e da CVM, em que a empresa “aumenta o seu número de ações, através de um desdobramento, efetuando em seguida o resgate dessas novas ações com base no valor patrimonial antes do desdobramento e o respectivo pagamento aos acionistas, utilizando como lastro a própria reserva especial de Ágio (reserva de capital)”. (…)

Substancialmente, nem a decisão recorrida negou a natureza dos rendimentos recebidos, mesmo que tenha apontado o que seria, no seu entender, a correta definição do desdobramento e resgate de ações, mantendo a glosa, todavia, por entender que os valores não teriam sido escriturados pela “YY” (pagadora) de maneira a legitimar a operação, situação que não subsiste, como evidenciado acima, porquanto os documentos juntados na impugnação, em conjunto com os documentos juntados na diligência, comprovam fartamente que a receita é oriunda de operação regular entre investidora e investida, que essa operação tem natureza de distribuição de dividendos e, portanto, não está sujeita ao pagamento de IRPJ.

Condição suspensiva
Em uma operação societária, pode ocorrer que parte do pagamento fique como caução, à espera que alguma condição ocorra, como uma auditoria, para só então haver a liberação com eventual ajuste no preço do negócio. Turma do Carf, apreciando autuação que tributou como ganho de capital todo o valor caucionado, decidiu pela desoneração porque a base de cálculo deveria ser o valor reduzido pelo ajuste, e tributada no momento da efetiva liberação; assim ementado:

Acórdão 2202-002.859 (publicado em 27.11.2014)
GANHO DE CAPITAL. ESCROW ACCOUNT. TRIBUTAÇÃO.
Somente haverá a incidência do Imposto de Renda sobre o ganho de capital, decorrente da alienação de bens e direitos, relativo a rendimentos depositados em escrow account (conta-garantia), quando ocorrer a efetiva disponibilidade econômica ou jurídica destes para o alienante, após realizadas as condições a que estiver subordinado o negócio jurídico.

Vício explícito
Quando um lançamento tributário é anulado por vício material (por exemplo, erro na descrição do fato gerador, conforme o Acórdão 9202-002.749), pode o fisco não ter mais tempo para novo lançamento, se já tiver passado mais de cinco anos do fato gerador. Todavia, quando a anulação se dá por vício formal (por exemplo, descrição incorreta da infração, conforme o Acórdão 9303-002.432), o fisco passa a dispor de mais cinco anos para lançar (art. 173, II do CTN).

Com essa preocupação, a PFN provocou, via Embargos de Declaração, órgãos julgadores para definirem a natureza da nulidade, o que recebeu resposta diferente em dois julgados. No primeiro, Turma do Carf concordou que a matéria ficou omissa e possível de ser suprida via Declaratórios; assim ementado:

Acórdão 2301-004.069 (publicado em 20.11.2014)
EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. ARTIGO 65 DO RICARF.
Havendo omissão em relação à conceituação do vício identificado no lançamento deve-se acolher os embargos para sanar o vício existente.

Voto (…)
No que diz respeito à natureza do vício reconhecido em assentada anterior, em que pese não haver disposição expressa a fundamentação do voto condutor evidencia tratar-se de vício material.

No segundo julgado, outra Turma do Carf considerou que não enseja Declaratórios a falta de explicitação da natureza do vício que gerou a nulidade, até porque é possível extrair a informação dos fundamentos do julgado; assim ementado:

Acórdão 3403-003.261 (publicado em 18.11.2014)
OMISSÃO. OBSCURIDADE. CONTRADIÇÃO. INEXISTÊNCIA.
Constatado a inexistência omissão, obscuridade e contradição, não há o que se manifestar o esclarecimento objeto do declaratório não encontra encartado nos pressupostos aqui relacionados, pois o julgador não está obrigado a declinar a natureza do vício, formal ou material, que macula o ato administrativo.

Voto (…)
No que tange ao esclarecimento em relação à natureza do vicio, essa Turma vem reiteradamente firmando que o julgador não está obrigado declinar se trata de vício formal ou material. De modo que, o declaratório não se presta ao fim da interposição, visto que, não inexistindo obscuridade, omissão e contradição, impondo em conhecer e negar provimento.

Prova da pejotização
Dois julgamentos de autuações por relação trabalhista disfarçada, na chamada “pejotização” irregular. No primeiro, analisada e tida como prova insuperável uma decisão declaratória da Justiça do Trabalho, afastando o vínculo empregatício. E Turma do Carf se curvou ao pronunciamento judicial, mantendo a autuação apenas para os outros casos nos quais a fiscalização fez a mesma desconsideração da prestação de serviço para relação empregatícia e não houve uma decisão trabalhista em outro sentido; assim ementado e fundamentado:

Acórdão 2301-004.135 (publicado em 20.11.2014)
DA AUSÊNCIA DE RELAÇÃO TRABALHISTA NOS CONTRATOS CELEBRADOS COM SUB-EMPREITEIRAS.
Não pode ser considerado com empresa sub-empreiteira as pessoas jurídicas que tem a mesma atividade fim do Recorrente e que estejam submissos ao empregador, nos moldes do artigo 3º da CLT, ou seja, tenham vinculo empregatício.

NULIDADE POR VÍCIO MATERIAL.
Segundo o Códex Cível, Artigo 50, quanto a personalidade jurídica, há dois requisitos para desconsiderar a personalidade jurídica, sendo um o abuso da personalidade jurídica, caracterizado pelo desvio de finalidade e o outro a confusão patrimonial.

Havendo um dos requisitos acima, há de ser desconsiderada, ao menos para fins previdenciário, as personalidades jurídicas que tenham vicio em sua formação.

Todavia, não haverá de desconsiderar a personalidade jurídica de empresas que, em processo trabalhista, não conseguiram provar seu vinculo empregatício.

Voto (…)
Vejo que a Recorrente provou nos dois casos acima, ao contrário da Fiscalização, que a Justiça declarou o não vínculo de emprego, e, por isto, excluo do lançamento as duas pessoas que moveram o judiciário trabalhista.

Entretanto, mantenho todos os demais segurados empregados, seja porque reconhecido em Ata de Assembléia Geral Extraordinária da Recorrente, onde reconheceu o vínculo de diretores, remunerando-os, seja pelo esmerado trabalho da Fiscalização que provou as premissas de subordinação, onerosidade, habitualidade e exclusividade das demais empresas (segurados).

No segundo julgamento, dado destaque, como prova decisiva para manter a autuação, o fato de os empregados celetistas da contribuinte serem subordinados às PJs prestadoras de serviço; assim ementado:

Acórdão 2301-004.180 (publicado em 20.11.2014)
INEXISTÊNCIA DE VÍNCULO EMPREGATÍCIO IMPOSSIBILIDADE DE COBRANÇA DE CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA
Para justificar a desconsideração da personalidade jurídica das empresas prestadoras de serviços, considerou a Fiscalização que documentos apreendidos na Recorrente foram analisadas as Folhas de Pagamentos, os Livros Diário e Razão, as Notas Fiscais de prestação de serviço, recibos de pagamento e contratos de prestação de serviços. E, havendo empregados devidamente registrados e de pessoas físicas prestando serviços através de empresas interpostas, constatando-se que para os cargos de menor complexidade e capacidade técnica os segurados que os ocupavam foram considerados celetistas, enquanto os cargos de maior hierarquia e poder decisório foram executados pelas supostas pessoas jurídicas, às quais, inclusive, subordinavam-se os empregados celetistas, sendo que até fevereiro de 2006, o número de pessoas físicas contratadas através de empresas interpostas era superior ao de empregados registrados.

Desta forma configurada está a relação de emprego, porque os titulares das pessoas jurídicas contratadas pela Recorrente como prestadores de serviço preenchiam os pressupostos necessários à caracterização do vínculo empregatício com o contribuinte (onerosidade, pessoalidade, não eventualidade e subordinação), razão pela qual os titulares destas pessoas jurídicas foram enquadrados como segurados empregados da Recorrente, aferindo-se como remuneração de cada um os valores a elas pagos, sendo que as bases de cálculo utilizadas correspondem aos valores integrais constantes das notas fiscais e recibos discriminados na planilha “PESSOAS FÍSICAS REMUNERADAS ATRAVÉS DE EMPRESAS INTERPOSTAS”.

Decisões variadas
No Acórdão 9202-003.333 (publicado em 19.11.2014), a CSRF do Carf analisou se é possível conhecer questão implícita em Recurso Especial. É que, no julgamento recorrido, Turma do Carf retirou a multa qualificada de autuação, o que fez aflorar a decadência. Contudo, para reverter essa decisão, no Recurso Especial a PFN trouxe divergência apenas quanto à qualificação, mas não quanto à decadência. Decidindo, a CSRF considerou estar implícita a discussão da decadência e julgou as duas questões; assim ementado: “compõem a lide todas as conseqüências da decisão recorrida. No caso, tendo sido restabelecida a multa qualificada, por comprovação do intuito doloso, é forçosa a aplicação da regra decadencial prevista no art. 173, I do CTN”.

No Acórdão 3302-002.711 (publicado em 01.12.2014), Turma do Carf aduziu que, no que tange a IOF, operação de mútuo externo não é equivalente a financiamento de exportação de mercadorias e serviços para fins de isenção; assim ementado: “não há isenção ou não incidência de IOF nos empréstimos concedidos por pessoa jurídica domiciliado no Brasil a pessoa jurídica domiciliada no exterior. Capital financeiro não é mercadoria e sua movimentação, para dentro ou para fora do país, não se equipara a uma operação de exportação de mercadoria. Isenção ou exclusão tributárias não podem ser instituídas por decreto”.

No Acórdão 1101-001.166 (publicado em 25.11.2014), Turma do Carf afastou glosa de excesso de despesa financeira em operação de swap, aduzindo que só pode haver limitação de dedução quando o objetivo da operação for especulativo, mas não quando for para cobertura de risco; assim ementado: “os lançamentos fiscais aqui controvertidos partem da equivocada premissa de que as perdas em operações de Swap para Hedge também só seriam dedutíveis até o limite dos ganhos auferidos nessas operações, numa leitura em tiras da legislação de regência que faz tábula rasa do citado inciso V do art. 77 da Lei n. 8.981/95, razão pela qual é absolutamente insustentável o lançamento em destaque”.

No Acórdão 1401-001.149 (publicado em 27.11.2014), Turma do Carf não reconheceu direito de restituição em relação à chamada “propagando eleitoral gratuita”; assim ementado: “a compensação fiscal em virtude da transmissão de propaganda eleitoral e partidária gratuita pelas emissoras de rádio e televisão é feita sob a forma de dedução da base de cálculo do IRPJ, inexistindo previsão legal para sua restituição, ressarcimento ou compensação tributária nos moldes do art. 74 da Lei nº 9.430/96”.

Fonte: ConJur via Mauro Negruni

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